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CONTRIBUIÇÃO AO JULGAMENTO DO
 CONGRESSO DE POESIA

Por  PAGÚ – PATRÍCIA GALVÃO

 

In. Diário de São Paulo, 9 de maio de 1948

 

Caracterizou, principalmente, o Congresso de Poesia, o debate surgido na base de uma tese, que registrou o aparecimento da "nova poesia", datada de 1945. A data de 1945 - é singularmente aproveitada, pois se trata de um ano histórico, de transformação política, primeiramente, na vida interna do país, o que dá uma nova perspectiva econômica, também, tudo sofrendo as influências de uma transformação mundial, que é a que acarretou nesse ano o fim da Segunda Guerra, com o aniquilamento do eixo nazista. O grupo de que saiu essa tese, apresentada pelo sr. Domingos Carvalho da Silva, é o mesmo grupo que lançou a krista Brasileira de Poesia, responsável também pela concretização do Congresso.

Caracteriza-se o autor da tese como porta-voz, pelo comportamento de todos os componentes do grupo, que não apresentaram nenhuma tese contrária ou paralela a esse ponto de vista, e durante o Congresso apoiaram, cada um por sua vez, sem quebra de unidade, a "nova poesia", datada de 1945. A tese da "nova poesia" voltou-se, em sua crítica ao passado, até a Semana de Arte Moderna de 1922, desse movimento destacando a poesia, para dizer que a "nova" é uma "conquista" de 1945, desligada inteiramente das pesquisas de então. O movimento de 1922 é assim considerado "coisa morta" pelo grupo do sr. Domingos Carvalho da Silva.

Entre os debates suscitados, formulamos a seguinte crítica e indicação, apressadamente redigida, entre as sessões da tarde e da noite de sábado, i° de maio:

 

A tese do sr. Domingos Carvalho da Silva tem importância, não porque seja um marco dentro do Congresso de Poesia, como estava na intenção desmedida do autor. Ela tem importância porque, dentro de suas linhas, repousa o consentimento de um agrupamento de moços. Não é o autor que fala, é uma corrente, embora esta corrente, como não podia deixar de ser, traga uma deformação congênita. E a corrente que cresceu dentro de um estado de espírito estreito, passivo, oprimido. Essa geração não tem culpa. Dentro dos muros da opressão ela não pôde desenvolver as suas asas.

 

Por que o sr. Domingos Carvalho da Silva toma-se de uma espécie de fobia, como se mencionou na discussão, opondo a existência de uma poesia de 1945 à poesia de 1922? Muito simplesmente porque 1922 é um marco revolucionário — e 1945 é apenas a saída de uma prisão sem que os prisioneiros libertados saibam o que fazer de sua liberdade. Não são portadores de uma nova palavra de ordem. Olham para trás e só vêem 1922, e podemos pensar que, com essa fixação", a tese do sr. Domingos Carvalho da Silva nada mais é que uma tentativa sonolenta de um manifesto para formular um grito de independência. E justo que assim o desejem ele e os que o apoiam, verificando que não há mais grades para a sensibilidade e para o sonho. Mas, não é atacando o passado, e um passado que é um marco, como 1922, que o hão de conseguir.

Não estamos aqui com procuração para defender 1922. Temos o que criticar nessa etapa. Vinte e dois são os dez dias que abalaram o mundo na literatura brasileira. Não porque fosse caracterizado por um pensamento de exportação de poesia e de libertação de formas, podres e mortas. Mas porque 1922 foi o nosso reflexo provinciano do maior movimento de revisão nas artes que se produziu no mundo e na história. Em um período de vinte anos, que se pode fixar na quadra de 1905 a 1922, na poesia, conhecemos desde o simultaneísmo* até o surrealismo. E a quadra de Proust, de Rilke, de Joyce, do futurismo, de Apollinaire, da Nouvelle Revue Française, de Fernando Pessoa, de Max Jacob, de Garcia Lorca, da revolução na tipografia, da presença de Freud.O nosso 1922 tem, portanto, ligação umbilical com a revolução artística que a Primeira Guerra trouxe no seu bojo.

Entretanto, os homens de 1922 não completaram o seu movimento. Houve uma grossa traição. Diante da antropofagia, ramificação de 1928, Mário de Andrade confessava que só se mantinha na primeira fase da "Revista", para manter o "aplomb". Deu-se então o estouro da boiada. A revolução de 1922 acabou, embora até hoje o sr. Oswald de Andrade permaneça de facho em riste, bancando o Trotsky, em solilóquio com a revolução permanente.

Não cabe estudar aqui o que aconteceu no meio, o grupo que surgiu de 1928 a 1935, nem o abandono das velhas barricadas. Podemos hoje comparar 1922 com a tradição da Comuna, que só deixou o germe. Concluindo, pensamos que o sr. D. C. da S. tem de fazer no mínimo uma revolução, se quiser se qualificar pelo menos como soldado raso da nova investida. A "conquista" que afirma ter feito, conforme está na tese, da poesia de 1945, não passa de uma sublimação que armou este congresso para ter onde se expor.

Pedimos ao Congresso que repila o papel de submissão, diante desse malabarismo, recusando sua adesão a um ponto de vista de um grupo que quer tomar o poder, sem ter credenciais para isso.

 

INDICAÇÃO : Pelo seu caráter de ensaio, pela tentativa de empolgar uma situação que só pode ser obtida na manipulação do "fogo sagrado", o Congresso de Poesia rejeita a tese do sr. D. C. da S., pela sua inocuidade.

Este ponto de vista oposto ao dos "donos" do Congresso procura mais esclarecer como deve ser considerado o movimento de 1922, sem levar em consideração as opiniões particulares dos componentes da Semana de Arte Moderna.

O movimento de 1922 interrompeu-se em 1928, conforme asseveramos. Rompeu-se com o desdobramento da Semana, no movimento da antropofagia, qualquer que seja a consideração que se deva a esta ramificação, se se quiser fazer um estudo atento à evolução das formas e doutrinas literárias. Cindiu-se na base da antropofagia o grupo de 1922, cindiram-se os aderentes, outros surgiram. Mas a cisão foi fatal ao movimento. Trouxe primeiramente um desperdício enorme de forças. Na nossa vida semicolonial, continuavam a serem ouvidas as vozes do mundo: o movimento literário, intelectual, brasileiro, dividiu-se em três correntes nítidas. Mário de Andrade mantém-se, com o seu grupo, muito próximo e dentro mesmo, do Partido Democrático, que se distende até o movimento constitucionalista; Oswald de Andrade e o seu grupo, na pesquisa do socialismo, distribui-se pelas ideias da extrema esquerda até o comunismo militante, cuja experiência fizeram nos primeiros anos após 1930; e o grupo que saíra de uma mitologia sob medida talhada no totem da Anta, tingida pelo verde-amarelismo, encarnaria o mussolinismo caboclo, é Plínio e os seus integralistas. Essa distribuição de forças de um grupo tão pobre como era em sua totalidade o grupo dos intelectuais modernistas, desviou completamente a literatura de suas possibilidades.

Individualmente, os que se mantinham mais à margem, um Antônio de Alcântara Machado, um Murilo Mendes, um Carlos Drummond, puderam fazer algo. Politicamente mais atrasado do que todos, como militante, Mário de Andrade realizou a sua evasão na poesia, dedicando-se também a objetivos pedagógicos, que era o seu meio de se tornar um "chefe", um "duce" da juventude. Sua intensa atividade de missivista equivale a um apostolado. Por ser a figura com maiores possibilidades de uma unificação do movimento modernista, ele simboliza o recuo sofrido com a fragmentação verificada desde 1928. Suas responsabilidades são enormes, e ele o confessa ao único agrupamento com possibilidades que surgiu desde a antropofagia; o grupo que produziu a revista Clima. Leia-se a sua "Elegia de abril", que é um balanço, e precariamente feito, da "inteligência nova" do Brasil.

Veja-se como ele culpa a inteligência de ter sido a "mais fácil de se perverter a si mesma", transformando-se numa justificação dos atos, derivados do "enfraquecimento da sensibilidade", reduzida a "costume". Por isso ele recomenda que se obedeça mais à sensibilidade, mas tempera este conselho com um "talvez", pois vive incerto. Sempre viveu incerto: nele é que se deu, mais do que ninguém, a tragédia de haver se esquecido de si, do amor, dos sentimentos. Há sete anos, exatamente, em maio de 1941, Mário de Andrade denunciava o tema da desistência, mas não via que ele fora o primeiro que desistira: desistira do verdadeiro papel que poderia ter tido, lembrando-se, muito tarde, de reeditar o conselho de Goethe aos moços de seu país, pedindo que se superassem porque "não convém à inteligência brasileira se satisfazer tão cedo de suas conquistas". A essa desistência é que nos chamamos "traição".

O Congresso de Poesia, que reeditou tão limitadamente a Semana de Arte Moderna de 1922, ofereceu o espetáculo triste de um grupo de jovens satisfeitos consigo mesmos, pensando-se, até por excesso de expressão, desligados do passado imediato e remoto. Foi útil por permitir entretanto que a discussão e a crítica os atingisse em cheio, e que até um clarão de madrugada tingisse os horizontes, nas promessas da geração novíssima que também os defrontou.

Os germes de 1922 estão frutificando. A própria sublimação da tese do sr. Domingos Carvalho da Silva é um reflexo, nítido, em sulco profundo, da existência daquele marco. Está ainda tão vivo, como "possibilidade", que ninguém pode viver sem ele em S. Paulo, necessitando-se "matá-lo" para que a arte, no caso a poesia, deixe aquele amante e o seu amor. Dostoiévski sabia disso, e o cidadão Kane também.

SÓ UMA OUTRA REVOLUÇÃO ARTÍSTICA PODE SUBSTITUIR NA HISTÓRIA E NA EVOLUÇÃO DA NOSSA SENSIBILIDADE E DA NOSSA INTELIGÊNCIA A REVOLUÇÃO DE 1922.**

  

 

* O poema universal, de Henri Barzun, é de 1907, mas suas pesquisas no simultaneismo vinham de muito antes. (N. A.)

**A crítica e indicação ao Congresso teve a assinatura também de Geraldo Ferraz. O plural desta contribuição também nos representa. (N. A.)


 

 

 
 
 
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